O dever do Senado
- O Estado de S. Paulo
- 22 de jul. de 2023
- 3 min de leitura
A reforma tributária que passou na Câmara acolheu pontos que protegem os Estados e que vieram do Senado. É obrigação do Senado, pois, aprovar a reforma que ajudou a construir
ESTADÃO OPINIÃO - 22/07/23, 22:06
A aprovação da reforma tributária pelos deputados foi um feito na história brasileira.
Não há, nos anos recentes, algo comparável ao que ocorreu na semana passada na Câmara.
Poucas vezes se viu um apoio tão expressivo a um texto que promove mudanças tão profundas e necessárias no sistema tributário.
Agora que a proposta chega ao Senado, os senadores terão a oportunidade de mostrar o mesmo senso de compromisso com o País.
O Senado é o ambiente legislativo em que os Estados são representados. É comum que senadores já tenham sido governadores ou almejem disputar o cargo ao longo de sua vida pública. Cinco dos nove presidentes da República desde a redemocratização por lá passaram, prova da responsabilidade que significa ocupar uma das 81 cadeiras do Senado.
No caso específico da reforma tributária, uma vez que a proposta começou a tramitar pela Câmara, caberá ao Senado atuar como casa revisora. É bom que tenha sido assim, pois a reforma produzirá impactos sobre o tributo que sustenta as finanças dos Estados – o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
A essência da reforma tributária é simplificar o sistema, eliminando as disfuncionalidades de um modelo marcado por regimes especiais, subsídios, cumulatividade e regressividade.
Uma de suas alterações mais importantes é a que muda a incidência do ICMS sobre bens e serviços da origem para o destino, distorção que criou as condições para a guerra fiscal.
Adotada por alguns governadores, essa estratégia desesperada para atrair empresas drenou as receitas dos Estados e pouco se reverteu em termos de crescimento e geração de empregos.
À virtude da reforma tributária aprovada pelos deputados é que ela acolhe as questões que tanto preocupavam os governadores - e isso ocorre não por acidentes, mas por contribuição do Senado.
Não é algo trivial, uma vez que foram justamente receios quanto à perda potencial de arrecadação e de investimentos que impediram a construção de um consenso mínimo sobre a reforma nos últimos 35 anos.
É importante reconhecer as diferenças entre o texto original da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, de autoria da Câmara, e a redação final a que os deputados deram aval na semana passada. Muitas destas diferenças refletem justamente sugestões que inicialmente faziam parte somente da PEC 110/2019, de autoria do Senado.
Originalmente, a PEC 45 estabelecia um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) único, em vez do IVA dual e do imposto seletivo propostos na PEC 110. A PEC 45 determinava uma alíquota única, enquanto a PEC 110 previa setores isentos e com direito a alíquotas reduzidas.
O Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) só existia na PEC 110; ambas mantinham o Simples Nacional, mas somente a PEC 110 mantinha a Zona Franca de Manaus.
Um dos pontos que mais geraram debate na Câmara foi a criação do Conselho Federativo para gerir as receitas de Estados e municípios, prevista apenas na PEC 110.
Questionada pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, a governança do conselho foi ajustada ainda na Câmara, tendo como premissa o equilíbrio na relação de poderes entre os Estados e o fortalecimento da Federação, em linha com o que defende o Senado.
Resta claro que a reforma aprovada na semana passada não foi a reforma tributária da Câmara, mas uma junção dos textos propostos na Câmara e no Senado há quatro anos.
É isso o que explica muito do apoio expressivo que ela recebeu dos deputados – e é isso que os senadores devem ter em conta quando tiverem a chance de se posicionar sobre a reforma.
Há tempo e espaço, no entanto, para que o Senado aprimore a redação final da proposta. Preservar seu espírito é aprovar uma reforma ainda mais justa, que reveja parte das exceções a que os deputados deram aval de última hora. *Os privilégios dados a alguns oneram a alíquota geral de todos os demais – e foi assim, aos poucos, que o País chegou ao manicômio tributário que finalmente será encerrado agora.
É, portanto, dever dos senadores defender a reforma aprovada na Câmara, que protege os Estados e que o Senado ajudou a construir.
Fonte: https://www.estadao.com.br
Komentarze